"Ser marxista é, antes de mais nada, ser anticapitalista, ou seja, lutar pela construção de uma sociedade sem classes, que suprima a exploração do homem pelo homem e a propriedade privada dos grandes meios de produção, criando condições para que as relações entre os homens sejam fundadas na solidariedade e não no egoísmo do mercado. Claro, ser marxista não é repetir acriticamente tudo o que Marx disse. Marx morreu há cerca de 120 anos e muita coisa ocorreu desde então. Mas, sem o método que ele nos legou, é impossível compreender o que ocorre no mundo. Ele nos disse que o capital estava criando um mercado mundial, fonte de crises e iniqüidades, e nunca isso foi tão verdadeiro quanto no capitalismo globalizado de hoje. Falou também em fetichismo da mercadoria, na conversão do mercado num ente fantasmagórico que oculta as relações humanas, e nunca isso se manifestou tão intensamente quanto em nossos dias, quando lemos na imprensa barbaridades do tipo 'o mercado ficou nervoso'." (Carlos Nelson Coutinho)

quarta-feira, 25 de abril de 2012

A Teologia da Libertação



"A Teologia da Libertação nunca teve Marx como pai nem como padrinho. Ela bebeu primeiramente de sua própria fonte, que é a tradição judaico-cristã, que sempre deu centralidade aos pobres, ao tema da libertação do cativeiro egípcio e babilônico e à prática histórica de Jesus, que foi pobre e disse "felizes de vocês pobres e ai de vós ricos". E que não morreu tranqüilamente na cama como um piedoso rabino cercado de discípulos, mas na cruz, fruto de um juízo político-religioso que o condenou com o castigo dado a revoltosos sociais. Mas ela encontrou em Marx as boas razões para entender por que o pobre não é pobre, e sim um explorado e injustiçado. Ele é um empobrecido, feito pobre por fatores de ordem econômica, social e cultural, que hoje ganham corpo especialmente no capitalismo. Isso deu lucidez à Teologia da Libertação, mas também atraiu as acusações das classes sociais conservadoras, que sempre usaram a Igreja para legitimar seu projeto, que implicava a exclusão do povo." (Leonardo Boff; teólogo, filósofo e escritor)


A Teologia da Libertação e as transformações do mundo
Waldemar Rossi*

Na segunda metade da década de 60 do século passado começa a aparecer uma elaboração teológica embasada na dura vida do povo latino-americano. Fruto de dezenas de anos de vivência, de engajamento social e político e de testemunho cristão no meio do povo, a Ação Católica deu uma enorme contribuição à reflexão teológica a partir da vida, do cotidiano desse mesmo povo.

As motivações surgidas nas constantes reflexões dos vários movimentos de Ação Católica, e as luzes emanadas do Concílio Vaticano II, animaram os vários teólogos - comprometidos com a caminhada do povo simples e lutador - a elaborar uma teologia que iluminasse os cristãos, de forma ordenada e profunda, e os animasse a assumirem os desafios do mundo do trabalho, no campo e nas cidades, do engajamento político e social. No centro dessa elaboração teológica, além dos valores da LIBERTAÇÃO - inspirados na longa experiência do Povo de Deus, do tempo do Antigo Testamento, e nas experiências dos cristãos, renovados pela Boa Nova de Jesus Cristo – estavam, também, os valores e contra-valores dos Conflitos de Classe, presentes no Sistema de Exploração do Trabalho Assalariado, comandado pelos interesses da Produção Industrial. Em suma, nessa Teologia da Libertação estava e está presente um certo conceito da Luta de Classes elaborado por Marx, assim como estão presentes os anseios e as lutas pela libertação, contidos em todos os livros da bíblia, portanto, presente nas experiências do povo Hebreu e também na pregação e na prática de Jesus Cristo. (Mt. 5, 1-12; 9, 14-17; 23 (todo); Mc. 11, 15-19; 12,1-10;12, 38-40; Lc. 1,46-55; 2,33-35; 4, 17-21 e 24, 17-21)).

Os encontros de Medellin e Puebla, iluminados pelas luzes da Teologia da Libertação, impulsionaram as Comunidades de Base, uma nova maneira de ser Igreja, que assimilaram o sentido da libertação evangélica, enraizada nas lutas constantes para vencer a "moderna" opressão imposta pelos poderosos de nossos tempos. Foram anos frutuosos em que, das CBs, nasceram dezenas e dezenas de grupos que assumiram prá valer as lutas por moradia, transporte, saneamento básico, iluminação pública, educação, creche, saúde pública. Os ensinamentos contidos nessa Teologia colaboraram para que várias centenas de trabalhadores, homens e mulheres, operários e lavradores assumissem, com muita garra, a luta pelo desatrelamento sindical das amarras do Ministério do Trabalho, pelo direito da livre organização sindical e a luta pela liberdade de organização partidária.

A Teologia da Libertação foi fundamental para a firme postura da Igreja (tanto católica quanto das igrejas do CONIC), de enfrentamento com a ditadura militar, denunciando seus crimes, exigindo seu fim e a volta da democracia. A opção preferencial pelos pobres, assumida pela Igreja, está alicerçada nos profundos conceitos de justiça nela contidos.

O próprio Jesus nos advertia quanto às perseguições que sofreríamos por assumir a causa da sua Boa Nova. Assim foi com esse extraordinário movimento. A perseguição veio de fora e de dentro da própria Igreja, de setores que controlam o Vaticano, inconformados com os avanços dos cristãos rumo às idéias do socialismo. Muito se fez para confundir a opinião pública mundial, colocando no mesmo barco os ideais e a consagrada e universal luta de classes com as várias propostas de luta armada. Por mais que se procurasse mostrar que as experiências não são iguais, esses mesmos setores não abriram mão de tentar impor pesadas e injustas censuras à Teologia da Libertação. Muito se dizia à época que setores do Vaticano eram muito simpáticos ao modelo norte-americano, daí a razão desse infeliz combate. Tivemos até mesmo uma certa dose de inquisição imposta aos teólogos dessa corrente teológica.

Os tempos passaram, houve um pequeno retrocesso, momentos de dúvidas, hesitações, porém, as raízes profundas " como uma árvore plantada junto ao rio" resistiram, vencendo a tempestade. A caminhada nunca parou e, adaptada aos novos tempos, continua firme, rumo aos horizontes libertários.

A CNBB, é o sinal dessa presença obstinada, teimosa e perseverante na luta pela justiça social. Iniciativas como as Campanhas da Fraternidade, as Semanas Sociais Brasileiras, os documentos sobre as eleições, pela erradicação da miséria e da fome, os documentos e os plebiscitos sobre a Dívida Externa e sobre a ALCA são o resultado dessa permanente luta pela libertação do nosso povo e de todos os " povos oprimidos pelo capital opressor".

Em nosso entendimento, quanto mais avança a exploração do capital, mais se afirma a importância e a necessidade desse grande movimento teológico. Nunca, na História da Humanidade, a escravização e a exclusão econômica e social foram concomitantemente tão cruéis quanto em nossos tempos. A teologia da Libertação torna-se o grande instrumento de conscientização e de mobilização do povo marginalizado capaz de fazer frente à ideologia do capital, pois, " UM OUTRO MUNDO É POSSÍVEL". Podemos construir um mundo diferente, alicerçado na justiça, no direito e na fraternidade. O momento histórico nos convida a fazê-lo.

*Waldemar Rossi é sindicalista da Oposição Metalúrgica de São Paulo, aposentado; Membro da coordenação da Pastoral Operária de São Paulo

Nenhum comentário:

Postar um comentário